Poesias

OLIVER HARDEN       Voltar   Imprimir   Enviar   Email

Quando as Conjecturas Suplantam a Verdade. ( Oliver Harden )

A história do pensamento humano é atravessada por uma tensão permanente entre a busca da verdade e a tentação das conjecturas. A verdade, entendida como aquilo que resiste ao escrutínio racional e à prova da realidade, é lenta, exigente e raramente dócil. Já a conjectura, filha da imaginação inquieta e do desejo de antecipar o real, é veloz, sedutora e adaptável. Não surpreende, portanto, que em muitos períodos da história e, sobretudo, em nossa contemporaneidade, a conjectura se erga acima da verdade, convertendo-se em moeda corrente no mercado das ideias.
A conjectura, por sua natureza, não é um mal em si. Pelo contrário, ela é o primeiro lampejo da investigação, a centelha que desperta a dúvida, o passo inaugural do espírito que ousa perguntar. Como já lembrava Popper, a ciência se edifica sobre conjecturas que se oferecem ao crivo da refutação. Mas quando as conjecturas deixam de ser reconhecidas como suposições transitórias e se arrogam o lugar de verdades definitivas, convertem-se em simulacros, em sombras que pretendem eclipsar a luz.
A era digital, que promete informação instantânea, é também a era da conjectura elevada à condição de verdade pública. Bastam alguns indícios soltos, uma narrativa conveniente, e a conjectura se multiplica em telas e discursos como se fosse uma revelação indiscutível. A verdade, lenta e paciente, não encontra espaço em meio ao clamor da rapidez. Platão já advertia que as sombras projetadas na parede da caverna pareciam mais reais que os objetos iluminados fora dela. Hoje, as conjecturas ocupam o papel dessas sombras, e multidões as tomam como realidade.
Nietzsche diria que o homem não suporta a nudez da verdade, que busca constantemente véus, ilusões, perspectivas que o poupem da vertigem do real. Nesse sentido, a conjectura serve como consolo e como arma. Consolo, porque protege o indivíduo da dureza daquilo que é; arma, porque serve aos que desejam manipular, fabricar crenças, instaurar dogmas sem fundamentos.
O perigo maior não reside na conjectura em si, mas na inversão de valores: quando o possível se impõe sobre o verdadeiro, quando a aparência se torna mais sólida que a essência, quando o rumor pesa mais que a evidência. Tal inversão alimenta o espetáculo do engano, tornando o homem prisioneiro de ilusões que ele mesmo engendra. Baudrillard falaria de hiper-realidade, em que as simulações substituem o real e já não é possível distinguir um do outro.
Assim, refletir sobre o primado das conjecturas é refletir sobre a fragilidade de nossa relação com a verdade. A verdade exige silêncio, paciência, coragem para suportar sua face austera. A conjectura, ao contrário, oferece imediatismo, movimento, a doce embriaguez de um saber aparente. Se nos deixamos conduzir apenas por ela, corremos o risco de confundir a centelha provisória com o fogo eterno, o eco com a voz, a superfície com a profundidade.
A maturidade intelectual, portanto, consiste em saber conviver com as conjecturas como hipóteses fecundas, mas jamais permitir que elas se infiltrem no trono da verdade. A conjectura é o caminho, não o destino. Quando esquecemos disso, transformamos a busca do conhecimento em uma feira de ilusões, em que o rumor suplanta a razão e a verdade é relegada ao silêncio.
Oliver Harden

Autor: Eduardo Gomes
Data: 20/08/2025

 

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