Esse caráter passivo implica que, de certa forma, essa pessoa não é responsável por sua ignorância, ela simplesmente carrega consigo aquela 'falta'. É curioso, no entanto, que não se aplique a qualificação de ignorantes às crianças, mesmo que elas geralmente não dominem o mesmo conhecimento dos adultos.
Isso significa que a ignorância começa com um pressuposto: algo que se deve saber, mas não se sabe, um caminho pelo qual a pessoa deveria ter percorrido, mas não o fez. Então a ignorância abandona seu significado passivo para ter um significado ativo que implica não reconhecer algo ou agir como se não fosse conhecido. Aqui se entra no que é conhecido como 'ignorância motivada'.
A ignorância motivada é quando se escolhe, mais ou menos conscientemente, não saber mais, não se aprofundar, não entender. Essa ignorância é terrivelmente perigosa porque tende a levar a posições extremas e reduz a capacidade de continuar crescendo e amadurecendo. Quando a pessoa decide ser ignorante, alguém decidirá no lugar dela. Ela se torna manipulável.
Goethe já havia dito: 'Não há nada mais terrível que a ignorância ativa'. O filósofo Karl Popper pensava o mesmo: 'A verdadeira ignorância não é a ausência de conhecimento, mas a recusa em adquiri-lo'.
Essa ignorância motivada pode ocorrer em todas as áreas da vida. Algumas pessoas começam a se sentir mal, mas ao invés de ir ao médico para receber um diagnóstico, elas preferem se refugiar na ignorância assumindo que está tudo bem. Outras pessoas suspeitam que seu parceiro é infiel, mas, em vez de esclarecer suas dúvidas, escolhem permanecer ignorantes. O mesmo acontece no nível político ou social: quando já se tem uma ideia formada, se opta por não escutar ou valorizar os argumentos contrários.
Um experimento realizado nas Universidades de Winnipeg e de Illinois mostrou quão forte e irracional a tendência para a ignorância motivada pode ser. Recrutaram 200 pessoas e lhes deram duas opções: ler e responder perguntas sobre uma opinião (casamento gay) com as quais concordavam ou ler um ponto de vista oposto.
Quem decidisse ler a opinião com a qual concordava ganharia $ 7 dólares; mas se escolhesse a opinião contrária, ganharia 10 dólares. Surpreendentemente, 63% optaram por ler a opinião com a qual concordaram, rejeitando a possibilidade de ganhar mais dinheiro.
Nesse caso, se opta por ser ignorante para evitar a dissonância cognitiva. As pessoas desenvolvem uma concepção do mundo que manipula suas idéias e crenças, e temem que opiniões contrárias possam desestabilizar aquele castelo de cartas. É por isso que preferem ignorar tudo o que não corresponde à sua visão. No fundo, isso significa que a ignorância motivada é uma expressão de medo.
'O medo da ignorância é uma sensação que foi inculcada, sistematicamente, durante a escola. Refere-se à sensação de que não se sabe algo que muitos conhecem, por isso é melhor calar-se e se acomodar', disse o filólogo Igor Sibaldi.
Na escola, a ignorância é tratada como algo negativo e se começa a apontar o dedo para o ignorante. E isso gera um paradoxo porque, para superar a ignorância, deve-se primeiro reconhecê-la, mas não se deixa de reconhecê-la pelo medo de ser rotulado como ignorante. O escritor Baltasar Gracian disse que 'o primeiro passo da ignorância é presumir saber'.
Livrar-se da ignorância não é realmente difícil, basta informar-se, 'mas esse comportamento é praticamente impossível para a maioria das pessoas porque o hábito de se sentir ignorante se tornou algo mais forte do que o desejo de aprender' segundo Sibaldi.
A ignorância se torna uma zona de conforto em que a pessoa se sente muito à vontade para sair. Ou talvez nem se sinta tão confortável, mas o medo do que está fora, tudo o que desafia suas crenças, é tão forte que a mantém paralisada naquela zona de conforto. Assim acaba escolhendo a ignorância.
O ignorante não é aquele que não conhece, mas aquele que não quer saber. Portanto, o primeiro passo para expulsar a ignorância é desenvolver uma mentalidade de crescimento, uma mente aberta que permita explorar o maior número de possibilidades.
É quase impossível se livrar dos próprios estereótipos e crenças da noite para o dia, mas é possível questioná-los e olhar além do que sempre se considerou garantido. Deveria deixar as pessoas mais receosos de morrer todos os dias em uma zona de conforto que se estreitará mais e mais do que sair para descobrir o mundo, por mais diferente ou incerto que seja.
Fonte: Frimer, J. A. et. Al. (2017) - Journal of Experimental Social Psychology; 72: 1-12.