O canto de Patativa do Assaré ( Poesia e sobre o poeta )
Na década de 70 escreveu o cordel A Triste Partida, publicado em livro em 1978 e que perpassou o tempo, mantendo-se atual até os dias de hoje. Retrato dos mais bem feitos, de grande sensibilidade sobre a vida dos retirantes nordestinos, esse texto conta a história de uma família de retirantes. Um marido, roceiro, sua esposa e mais três filhos, todos cansados do sol escaldante daquele seco sertão nordestino, decidem - na verdade, o marido decide pela família - tentar uma vida melhor em São Paulo, mas, sempre pensando em voltar algum dia para a terra natal:
"Nós vamo a São Paulo, que a coisa tá feia; Por terras aleia, Nós vamo vagá Se o nosso destino não fô tão mesquinho Pro mêrmo cantinho Nós torna a vortá (...)
"Em riba do carro se junta a famia; Chegou o triste dia, Já vai viajá. A seca terrive, que tudo devora, Lhe bota pra fora Da terra natá. De pena e sodade, papai, sei que morro! Meu pobre cachorro, Quem dá de comê? Já ôto pergunta: Mãezinha, e meu gato? Com fome, sem trato, Mimi vai morrê! E a linda pequena, tremendo de medo: Mamãe, meus brinquedo! Meu pé de fulô! Meu pé de rosêra, coitado, ele seca! O carro já corre no topo da serra. Oiando pra terra, Seu berço, seu lá, Aquele nortista, partido de pena, De longe inda acena: Adeus, Ceará
No dia seguinte, já tudo enfadado, E o carro embalado, Veloz a corrê, Tão triste, coitado, falando saudoso, Um fio choroso Escrama a dizê: E a minha boneca Também lá ficou.
E assim vão dexando, com choro e gemido, Do berço querido O céu lindo e azu.
Os pai, pesaroso, nos fio pensando, E o carro rodando Na estrada do Su." (13)
"Agora pensando segui ôtra tria, Chamando a famia, Começa a dizê: Eu vendo meu burro, meu jegue e o cavalo, Nós vamo a São Paulo Vivê ou morrê."
Chegaro em São Paulo sem cobre, quebrado. O pobre, acanhado, Percura um patrão. Só vê cara estranha, da mais feia gente, Tudo é diferente Do caro torrão". Do mundo afastado, sofrendo desprezo/ Ali veve preso/ Devendo ao patrão [...]
Faz pena o nortista, tão forte, tão bravo Vivê como escravo Nas terra do su."
trabaia dois ano, três ano e mais ano E sempre nos prano De um dia inda vim. Mas nunca ele pode, só veve devendo, E assim vai sofrendo Tormento sem fim.
"Será muito natura nossa pátria entrar em guerra ao chegar em nossa terra o comunismo fatal; do sertão à capital nosso povo varonil há de pegar no fuzil em defesa da nação: que esta cruel sujeição não queremos no Brasil [...].
Nas folhas de uma revista li um conselho exemplar que ninguém deve aceita o regime comunista quem se assinar nesta lista ficará sem proteção, pois a negra escravidão grita ali em vozes altas e além de outras grandes faltas é contra a religião [...]
É um materialismo que nos faz perder a calma não tem coração nem alma quem apóia o comunismo esta espécie de ateísmo que perseguindo nos vem com a sua maldade além crê somente na matéria quem gosta desta miséria gosta do diabo também/ [...]
Leitor, meu caro leitor falo a verdade, não minto vive trapilho e faminto lá na Rússia o agricultor debaixo do tal rigor da maldita sujeição dentro da concentração privado da liberdade, cheio de necessidade só come quando lhe dão [...]
O seu regime é assim, ninguém tem direito à vida e a família é destruída na doutrina de Lênin, seu instinto de Caim seu coração de maldade implantou a crueldade com o seu tal comunismo na qual não há civism só reina a imoralidade (14).
Com atenção eu apelo para o supremo juiz por causa de um só Castelo nunca mais castelos fiz [...]
me prometeu um tesouro todo lindo, todo franco e em vez de um castelo de ouro me deu um Castello Branco.
Quero um chefe brasileiro Fiel, firme e justiceiro Capaz de nos proteger Que do campo até a rua O povo todo possua o direito de viver Quero paz e liberdade Sossego e fraternidade Na nossa pátria natal Desde a cidade ao deserto da exploração patronal
Quero ver do Sul ao Norte O nosso caboclo forte Trocar a casa de palha a por confortável guarida Quero a terra dividida para quem nela trabalha Eu quero agregar de dentro Do terrível sofrimento Do maldito cativeiro Quero ver o meu país Rico de tudo e feliz Livre do jugo estrangeiro A bem do nosso progresso Quero apoio do Congresso
Sobre uma reforma agrária Que venha por sua vez Libertar o camponês Da situação precária Finalmente meus senhores Quero ver entre os primores De baixo do céu de anil As mais sonorosas notas Do canto dos patriotas Cantando a paz do Brasil (15).
Por isso a Reforma Agrara nós mesmo vamo fazê nós todos juntos, os sem terra por vale, sertão e serra promovendo uma campanha abalando toda gente ficando assim igualmente furmiga quando se açanha (16).
Se um dia o Prestes alcançá vitora a minha história lhe contá eu vou e peço a ele pra me dá meu sítio que o Benedito do meu pai tomou (17).
Poema acima de Patativa do Assaré.
Patativa tornou-se uma referência da poesia cearense de todos os tempos. Fez o, até então, vilarejo de Assaré, tornar-se conhecido por gente tanto do Brasil inteiro, quanto de outras partes do mundo.
E foi assim que o autor criou asas que o fizeram voar longe e, assim como asas, ele ganhou também outra característica de um pássaro, seu epíteto, PATATIVA: "uma avezinha, por cima ela é azul, assim de frente ela é branca e o bico bem pequeno e grossinho (...) quando ela está cantando, assim, numa arvorezinha bem-copada, você escuta, você pensa que ali dentro daquela moita tem vários passarinhos cantando. De uma vez só ela imita muitos passarinhos pequenos" (18). Este é Patativa do Assaré!
Juliano Smith, Sociólogo.
Autor: Eduardo Gomes Data: 18/10/2005
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